“Você realmente acredita que a Lua só existe quando você a observa?” foi a pergunta feita por Albert Einstein enquanto discutia com Abraham Pais sobre a mecânica quântica. Parece uma pergunta sem sentido, a Lua continua no céu mesmo que ninguém a observe, mas o significado real desta indagação é uma forte crítica a mais comum das teorias quânticas, a interpretação de Copenhagen.
Vamos considerar um exemplo: Imagine que você tenha um aparelho que emita um feixe de partículas, elétrons, por exemplo. Você aponta este feixe para uma placa com duas pequenas frestas e atrás desta placa coloca um filme que brilha quando um elétron bate nele. O que você espera ver?
Este experimento é bastante familiar para quem já estudou um pouco de mecânica quântica e é conhecido como “experimento da dupla-fenda”. De forma intuitiva, esperamos que os elétrons atravessem uma das frestas e atinjam a placa , fazendo esta brilhar nas posições correspondentes a estas frestas. Não é o que observamos; na verdade vemos a criação de um padrão no filme com várias regiões onde chegam muitas partículas e regiões onde chegam poucas, de forma intercalada.
Se isto não fosse estranho o suficiente, caso tentemos descobrir por qual das fendas cada partícula passa, usando um detector em uma das fendas, por exemplo, o padrão desaparece. Na interpretação de Copenhagen, a partícula se comporta como onda e diferente de um objeto localizado, pode passar pelas duas fendas. Quando isto acontece, cada fenda age como uma fonte de ondas, permitindo que elas interajam entre si. Isto é, o elétron interage consigo mesmo e provoca efeitos mensuráveis.
Caso você não observe por qual fresta a partícula passou, dizemos que ela está em um estado de superposição, tendo passado tanto por uma fenda quanto por outra. Porém, ao observar a partícula, quebramos o estado de superposição, veremos ela passando por uma das fendas e assim ela não pode interagir consigo mesma, o que faz o padrão desaparecer.
Na interpretação de Copenhagen, a observação tem um papel muito importante! Ela “colapsa a função de onda”, isto é, se uma partícula se encontra em uma superposição de estados, ao fazer uma medida, apenas um desses estados pode ser medido e ao medir, realizamos um processo irreversível que coloca a partícula neste único estado.
Houveram diversos críticos à interpretação de Copenhagen que foi difundida principalmente por Niels Bohr e Werner Heisenberg. Entre os críticos está Einstein, que além da indagação apresentada no começo deste texto participou de uma série de debates públicos que ficaram conhecidos como debates de Bohr-Einstein. Segundo Einstein, a mecânica quântica conforme descrita por essa interpretação não era um teoria completa e levava a paradoxos.
Não há dúvidas de que a mecânica quântica funciona, porém os mecanismos por trás dos fenômenos quânticos não são completamente compreendidos. Existem diversas interpretações da mecânica quântica que mesmo usando abordagens diferentes preveem os mesmos resultados.
Apesar disso, a interpretação de Copenhagen é dominante entre os físicos, sendo a adotada em livros-texto dos cursos de graduação. Para se ter uma ideia melhor sobre a analogia da Lua, considere um átomo de hidrogênio, este consiste de um próton e um elétron orbitando seu entorno. Se usamos a interpretação usual, o elétron não está localizado, existe uma probabilidade de ele ser detectado em uma região do espaço, mas apenas uma medida determina onde ele está. Antes da medida é comum falarmos de uma “nuvem eletrônica”, isto é, a região do espaço coberta pela sua função de onda.
Mas o que é uma observação? E o que há de tão especial neste procedimento para colapsar a função de onda em um único estado? A teoria não responde esta pergunta. O que levanta questionamentos: O elétron só está lá quando o observamos? Ou isto é uma interpretação incorreta dos cálculos matemáticos?
Uma parcela dos físicos adota uma visão mais pragmática: Se não conseguimos entender o que há por trás do colapso da função de onda, mas isto descreve os resultados obtidos no experimento, então a teoria é suficiente para fazer as previsões necessárias e a menos que um experimento possa diferenciar as diferentes interpretações, as discussões são apenas filosóficas.
Isto é resumido em uma famosa frase “cale-se e calcule” (no original, “Shut up and calculate”). Apesar de particularmente não gostar dessa expressão, todas as previsões calculadas usando esta teoria quântica e sua interpretação física batem com os experimentos e além disso, a natureza não tem obrigação de fazer sentido ou ter uma interpretação simples, então talvez o que nos resta seja isto, calcular e comparar com experimentos.
Referências e Saiba Mais:
[1] Pais, A. (1979). Einstein and the quantum theory. Reviews of Modern Physics, 51(4), 863–914. doi:10.1103/revmodphys.51.863
[2] Mermin, N. D. (1985). Is the moon there when nobody looks? Reality and the quantum theory. Physics today, 38(4), 38-47.